Fanático por futebol inglês, Rafael Oliveira é um prodígio
jornalista que começou a comentar futebol na TV aos 18 anos
Ganhar a
vida falando de futebol é o sonho de muitos jovens, e foi realidade para o
fluminense Rafael Oliveira, que entrou no Esporte Interativo como estagiário e
logo já fazia parte das transmissões do canal. Fã de futebol inglês, Rafael nos
cedeu esta entrevista, onde falou sobre a seleção brasileira, futebol europeu,
interatividade e muito mais!
(Wilson
Hebert) A seleção brasileira tem sido
alvo de críticas pelo futebol apresentado e pela falta de definições na
preparação do time pra 2014. No seu blog, você escreveu sobre os problemas da
seleção inglesa, inclusive na demora para se escolher o novo técnico (que foi
anunciado em 1º de maio). Qual dessas duas seleções você acredita que terá mais
problemas para formar um time competitivo para a Copa no Brasil? Por quê?
A Inglaterra
está atrás, pois não tem o talento que a geração brasileira tem. Na verdade,
quando o assunto é seleção, a inglesa fica um degrau abaixo da brasileira,
mesmo com todas as críticas ao Mano. Se olharmos para os times, o estágio é
parecido, mas a diferença está na base. O Brasil tem mais opções e a Inglaterra
vive um período de dúvidas ao perceber que uma grande geração passou e o país
não chegou nem perto de uma conquista.
(Wilson
Hebert) Uma questão que tem sido
levantada no nosso site, é com relação a possibilidade da seleção brasileira
ter um técnico estrangeiro. O que você acha desse experimento? Seria válido,
exagero, não é o momento...?
Não tenho
nada contra a ideia, mas acho que não teria boa aceitação. O brasileiro, em
geral, tem uma soberba grande no futebol e é difícil imaginar que permitiria
alguém de fora comandando. Isso vale para todos (torcida, jogadores e
imprensa). Fora os técnicos brasileiros, que fariam um escândalo.
Em um
primeiro momento, acho mais interessante a entrada de estrangeiros para o
comando dos clubes. Assim, o futebol praticado no Brasil poderia sofrer
mudanças de forma gradual. Por exemplo, na compactação dos times, talvez a
maior diferença entre o futebol europeu e o brasileiro. A partir dos clubes,
seria possível criar novidades e alterar (ainda que minimamente) a formação dos
jogadores. Mesmo assim, ainda vejo uma rejeição grande por parte dos
brasileiros, que não gostam que alguém de fora “ensine” algo sobre o principal
esporte do país.
Ainda em
relação ao Mano, lamento bastante que o trabalho não venha dando certo e já
tenha um índice de rejeição tão alto. Digo isso porque poucos treinadores
brasileiros têm uma visão geral tão boa sobre o futebol. Pelo menos, teórica.
Ele não fecha os olhos para o que acontece na Europa e enxerga as diferenças
táticas. O problema é não conseguir aplicar e transformar isso em resultados.
Aí realmente complica.
(Vinicius
Brino) Muito já se especulou sobre a
adequação do calendário brasileiro ao europeu. Você concorda que devamos ter
datas parecidas com a do Velho Mundo ou o nosso calendário deve permanecer como
está?
Não acho tão
essencial. É fundamental a discussão sobre o calendário, mas vejo outras
prioridades. Principalmente a diminuição das datas para os estaduais e a
paralisação do Campeonato Brasileiro nas datas-Fifa.
Sobre a
mudança da temporada, não acho interessante apenas por copiar o estilo europeu.
A principal vantagem seria fazer uma boa pré-temporada no meio do ano, algo
impossível no começo do ano, independente dos estaduais, já que a Libertadores
começa em janeiro e obriga a reapresentação precoce. Mas tem uma questão: como
a TV e o povo reagiriam ao fato de não ter futebol em junho e julho?
(Victor
Mendes) Você é simpatizante assumido do
Real Madrid. Como começou essa relação de torcida com o clube?
Comecei a me
interessar por futebol europeu em 97/98, temporada em que o Real foi campeão da
Champions. O nível das seleções europeias na Copa de 98 me chamou atenção e
gerou interesse em conhecer mais de perto os jogadores e times. Era época
também em que os jogos de videogame e computador cresceram bastante (FIFA 97,
FIFA 98...). Eu tinha nove anos e, como o Real ganhou a Liga e o Mundial
naquele ano, a simpatia começou ali. Depois, passei a acompanhar de perto a
partir de 2001, quando virei um maluco por futebol europeu.
(Victor
Mendes) Cairia como uma mancha o Real
Madrid ser campeão quebrando recordes de pontos na Liga Espanhola, mas sem
nenhuma vitória ante o maior rival, Barcelona?
Não acho.
Vejo pelo outro lado. Seria um feito enorme vencer o Campeonato Espanhol
superando um Barcelona histórico. Se existe alguma mancha aí, é pensar na sequência
e na freguesia ao longo das temporadas. É dizer que o Real Madrid passou “X”
anos sem conseguir bater o maior rival, tomando uma goleada atrás da outra. Mas
como se trata de um dos melhores times da história do futebol, superá-lo em um
campeonato, ainda que sem vencê-lo, já é motivo de orgulho.
(Caio Cidrini) Como você avalia a atual situação do Chelsea com essas trocas de
técnicos e jogadores que querem mandar no time? E você acredita que há chance
de se implantar a mentalidade de trabalho de Manchester United e Arsenal, por
exemplo, em um clube comandado por um empresário?
Não acredito
em treinadores que repitam a longevidade de Ferguson, Wenger, Moyes. O futebol
inglês mudou e com o crescimento da liga, passou a movimentar muito dinheiro.
Com tanto investimento, a cobrança por resultados é mais imediata,
especialmente quando quem manda não conhece a cultura do país ou a maneira de
enxergar futebol com maior planejamento e poder para os técnicos. Ferguson e
Wenger fizeram parte da transição do futebol inglês antigo para o moderno e
tiveram sucesso durante a mudança. Por isso, ganharam tamanha estabilidade.
Mesmo assim, Wenger já balança nos últimos anos. Só não caiu porque o principal
sócio do Arsenal não parece ligar tanto para os resultados.
O Chelsea é
o maior exemplo. Teve bons técnicos que poderiam tranquilamente ter ficado, mas
não foi o que aconteceu. Em relação aos jogadores, não é difícil entender o
contexto. Terry, Lampard e Drogba foram os principais nomes da década que levou
o clube ao status de potência europeia. São os principais ídolos da torcida e
com todos os méritos. Conhecem o clube melhor do que qualquer um e têm total
admiração de Abramovich. O respeito vira poder quando algo começa a dar errado
internamente. A questão para o Chelsea é alguém que consiga conduzir a
reformulação do elenco sem se desgastar com os líderes, que já não rendem o
mesmo. Não é tarefa fácil.
(Vinicius
Brino) Os clubes-empresa se tornaram
moda no futebol, sendo uma válvula de escape para que os clubes mantenham um
alto nível. E a Inglaterra foi o país onde eles tiveram maior destaque. Você é
a favor ou contra essa medida de se transformar um clube de futebol numa
empresa? Acha que seria o caminho ideal a ser seguido no Brasil?
Tudo depende
da capacidade e mentalidade das pessoas envolvidas. O clube- empresa não é uma
garantia de sucesso, mas tem alguns lados positivos, como a tentativa de tornar
a administração mais transparente, com uma prestação de contas. Mas aí a dúvida
é de onde vai partir a iniciativa. Lá dentro, quantos são a favor da
transparência?
(Wilson
Hebert) Você, como um representante da
nova geração de jornalistas esportivos, poderia nos falar um pouco como foram
seus primeiros momentos nessa profissão tão requisitada? E na sua visão, quais
são os pontos mais essenciais a serem explorados por quem pretende ingressar
nessa carreira?
A grande
oportunidade foi fazer parte do Esporte Interativo no período em que o canal
foi lançado. Isso me deu a chance de participar de diversas áreas dentro da
empresa quando a emissora ainda não tinha o tamanho atual. Entrei como
estagiário em 2007. Em apenas dois meses, surgiu uma oferta para comentar um
jogo. Gostei da experiência e o pessoal elogiou. Não tem segredo. É questão de
determinação. Para mim, o requisito básico é realmente gostar do que faz. É
tentar acompanhar tudo o que pode por prazer, sabendo que, de alguma forma, vai
te ajudar em algum momento. É saber que vai abrir mão de muitas coisas pessoais
(fins de semana e horários “normais”, por exemplo) e que, às vezes, você terá
que ver alguns jogos pouco empolgantes por total obrigação, mesmo tendo outras
coisas mais interessantes para fazer.
E, claro,
aproveitar as oportunidades que surgem. O mercado é concorrido, mas sempre tem
espaço para quem se esforça para mostrar o que tem, seja em uma TV, rádio ou em
um blog. É saber que, quando você menos espera, alguém pode te dar uma
oportunidade.
(Jessica
Hellyrha) Como surgiu seu interesse por
comunicação? E essa paixão pelo futebol inglês vem desde pequeno?
Surgiu
tarde. Sempre gostei de escrever, mas o meu foco até uns 15 anos de idade era
outro. Engenharia, computação ou até mesmo geofísica. Coisas que passavam pela
minha cabeça. Mas a paixão pelo futebol europeu (e por esportes em geral)
acabou falando mais alto. Faltando um ano para o vestibular, mudei de ideia e
resolvi fazer jornalismo, algo que eu nem cogitava até então. Pensei que seria
algo que me daria prazer em trabalhar. E de fato é.
A paixão
pelo futebol inglês vem mais ou menos da mesma época e tem influência na
escolha da profissão também. No fim dos anos 90, comecei a acompanhar, ainda
que sem grande interesse. A virada do século foi o período em que o futebol
inglês começou a crescer e minha paixão veio de lá. De ter acompanhado a
explosão do campeonato a partir de 2001/02. Comecei a gostar dos médios e
pequenos. Criei o interesse em acompanhar como eram os jogos entre aqueles
times que só “apanhavam” de Manchester United e Arsenal. E aí sim veio o
“vício”. Hoje, brinco dizendo que torço para os 20 da Premier League. Em
diferentes níveis de simpatia, mas é verdade, já que não torço de verdade para
nenhum deles.
"Hoje, bastam alguns RTs para que um texto chegue ao conhecimento de todos. Antes, existia uma distância muito maior entre o jornalista e o garoto que tem vontade de entrar neste mercado."
(Mateus
Papini) O que você acha do jornalismo
mais extrovertido inserido no esporte, que mescla informação com humor? Você
não acha que isso tira um pouco da seriedade jornalística?
Não deveria,
mas tira. Não tenho nada contra o humor e acho fundamental para o nosso meio.
Cada programa tem sua proposta, claro. O problema é ver que a busca por
entretenimento tem colocado o humor no lugar da informação. Hoje, a gracinha
vale mais do que a notícia. A análise fica em segundo plano. Por que não fazer
a graça dentro da análise ou repercutindo a notícia? Faz parte e pode ser
divertido. O problema é encarar como tendência e tentar reduzir a cobertura esportiva
a isso. Aí vira perda de tempo e desperdício de conteúdo. Em alguns casos, até
falta de educação com o atleta. Para mim, tudo depende do público.
Para uma TV
que não tem o esporte como prioridade, é natural que se busque um formato
diferente para atender a todos os tipos de público. Mas para a TV de esportes,
é diferente. Parto do princípio de que é uma audiência interessada em notícias
e debates mais específicos. Para este público, o entretenimento está na
informação e no bom debate. Na minha opinião, o desafio da mídia especializada
é (ou deveria ser) elevar o nível da discussão, até como forma de influenciar
positivamente o olhar do torcedor. Ainda existe uma resistência enorme em
tratar do esporte com análises mais elaboradas. É mais fácil fazer piada e ser
superficial. E, infelizmente, vira o caminho.
(Bruno
Cassali) Há projetos de expansão do
canal? Porto Alegre, por exemplo, só vê o E+I via Internet.
Sim. Não
tenho informações mais concretas sobre cada cidade, mas a ideia é ampliar cada
vez mais.
(Bruno
Cassali) O E+I é o canal que melhor
aproveita a interação com redes sociais. Como isso é planejado? Existe a
intenção de aumentar, se possível, essa interação com o telespectador?
A
interatividade faz parte até do nome. Então sempre existe o interesse em buscar
novas possibilidades. Sobre planejamento, em relação ao pessoal que vai ao ar,
não tem segredo. A participação do telespectador é parte importante nas
transmissões e o público se aproxima do Esporte Interativo desta maneira, seja
por Twitter ou Facebook. Inclusive, com alguma frequência, o pessoal vota para
escolher o jogo que será transmitido.
(Bruno
Cassali) Na sua opinião, a tendência do
jornalismo esportivo é dar cada vez mais espaço para o debate e opinião com o
público?
É inevitável.
Ferramentas como o Twitter aproximam e criam essa relação. Para o bem e para o
mal. É importante a troca de opiniões e enxergar o “reply” como uma espécie de
feedback. Não adianta o comentarista querer ser o dono da verdade porque não é.
Então é muito interessante poder ter uma resposta imediata sobre como o
torcedor se sente sobre determinado assunto.
Sabendo
filtrar, claro, porque também tem seus pontos ruins: A incapacidade de muita
gente receber e aceitar uma opinião contrária ou que simplesmente critique algo
que mexa com a paixão... E a quantidade de erros primários de português então,
nem se fala. Mas o saldo é muito positivo. E é uma tendência que ganha cada vez
mais ferramentas. Hoje, já vemos a interação do público em quase todos os
modelos de transmissões esportivas, seja por texto ou vídeo.
(Bruno
Cassali) O melhor caminho para entrar no
meio do jornalismo esportivo é por intermédio das redes sociais?
É
impressionante como as redes sociais mudaram a dinâmica do jornalismo. Estou há
poucos anos no mercado, mas este caminho já é indiscutível. É natural. As redes
sociais aumentam a possibilidade de exposição do trabalho (seja com um post, um
comentário, um tweet). Hoje, bastam alguns RTs para que um texto chegue ao
conhecimento de todos. Antes, existia uma distância muito maior entre o
jornalista e o garoto que tem vontade de entrar neste mercado.
Vejo por
experiência própria. Há pouco mais de cinco anos, eu via como um desafio enorme
conseguir contato com alguém que trabalhasse na televisão. Hoje, é possível
conversar com várias pessoas através do Twitter. É apenas conseguir que seu bom
trabalho chegue a mais pessoas, o que naturalmente aumenta a chance dele ser
reconhecido.
(Bruno
Cassali) O que você pensa sobre
ex-jogadores que comentam jogos, exercendo funções jornalísticas em muitos
casos? Pra você, qual a importância da formação acadêmica no mundo do
jornalismo?
Não tenho
nada contra a presença em si. Acho interessante ter espaço para o comentário de
quem já viveu aquelas situações de dentro do campo. Só não pode ser
simplesmente isso. Pego os exemplos das ótimas transmissões dos esportes
americanos e do Campeonato Inglês. São vários ex-jogadores. Só que há uma
diferença importante. O nível de conhecimento. No Brasil, infelizmente, são
poucos os atletas que realmente acompanham e entendem de futebol a ponto de uma
análise mais profunda. É também uma questão cultural e até histórica. Em geral,
o brasileiro não dá tanta importância à análise do que acontece em campo e nem
faz questão de “estudar” o futebol.
Por isso,
faço a ressalva: o que realmente agrega? Mas não generalizo. Como em qualquer
profissão, alguns são bons e outros não, independente de ser jornalista ou
ex-jogador. O problema é saber que a qualidade muitas vezes não é nem levada em
consideração. O que vale é o personagem e as polêmicas que ele pode gerar, seja
pela personalidade ou pela característica de simplesmente cornetar.
Sobre a
formação acadêmica, acho importante, mas não essencial para todas as funções. O
jornalismo é muito amplo e seria muita pretensão imaginar que o jornalista está
capacitado para falar com propriedade sobre todos os assuntos e todas as áreas.
Sendo assim, nada mais óbvio que dividir espaço com especialistas que também
tenham boa capacidade de comunicação e que possam dar opiniões mais embasadas.
Embora a prática ensine muito mais, a formação é um passo importante,
especialmente pensando no jornalismo como notícia e apuração.
(Bruno
Cassali) Sendo um dos mais jovens a
comentar em televisão, você acha que tem algum preconceito dos mais antigos no
meio?
É curioso,
pois eu sei que existe mesmo sem nunca ter sofrido diretamente. Mas é natural e
eu entendo. Virei comentarista de um canal nacional de televisão aberta com 18
anos. Claro que não é comum e que muita gente questionava (e questiona até
hoje) o que aquele garoto está fazendo lá, como uma pessoa tão nova pode ter
bagagem para comentar sobre um esporte que todos acham que sabem mais do que o
outro e etc. Não me considero acima de ninguém.
Apenas tive
uma rara chance e dei a sorte de conseguir aproveitar. Mas nunca relaxei. E
sempre me pressionei por isso, tentando aprender cada vez mais para conseguir
compensar a pouca experiência. E aí agradeço muito também a todo mundo do
Esporte Interativo, pois sempre tive muito apoio de todo mundo. André Henning,
Vitor Sérgio, Jorge Iggor, entre outros... Pessoas que, por serem mais
experientes, poderiam ter tido esse preconceito, mas nunca tiveram. Pelo
contrário. Foram fundamentais para que eu conseguisse me sentir a vontade desde
o primeiro momento em uma função que eu não imaginava que faria, muito menos
tão jovem.
*Esta
entrevista foi feita pelo presidente de honra e fundador do LEITURA ESPORTIVA,
Wilson Hebert.
Fantástica entrevista, Excelente! sou um grande fã do Rafael Oliveira, ele como comentarista é gênio, sua analises são fantásticas,imparciais,tem uma visão muito grande sobre o futebol. Hoje eu o considero como uns dos maiores comentaristas do Brasil. @Vagner_F1
ResponderExcluirParabéns a todos envolvidos nessa entrevista.
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