Ex-piloto de Fórmula 1, atualmente na Stock
Car e comentarista da Rede Globo fala sobre a carreira e automobilismo.
São Caetano do Sul/SP
Como piloto são mais de 20 anos de carreira desde o
início no Kart, tendo alcançado a principal categoria do automobilismo em 2000,
quando estreou pela equipe Jaguar na Áustria em substituição a Eddie Irvine. No
ano seguinte foi piloto da Jaguar por quatro corridas e nove pela equipe Prost,
quando sofreu um acidente em Spa (Bélgica) que, de certa forma, contribuiu para
encerrar sua carreira como piloto principal na Fórmula 1. Entre 2002 e 2004 foi
piloto de testes da Ferrari e desde 2005 está na Stock Car.
Paralelamente ao automobilismo, é comentarista de Fórmula
1 da Rede Globo desde 2005, tendo se destacado pelo vasto conhecimento técnico
da categoria.
Confira abaixo a entrevista dada pelo piloto ao Leitura
Esportiva:
(Cleyton Santos) Burti,
no auge de sua carreira, você correu na F1 junto com Rubens Barrichello, e
tendo relativo destaque, justamente na época em que ele também estava em
evidência na Stewart, e posteriormente na Ferrari. Conhecendo Barrichello, o
que você acha da ida dele para a IRL? Você achava que já estava na hora dele
buscar novos ares?
Luciano
Burti: Pessoalmente eu acredito que fará muito bem ao Rubinho
uma vez que ele terá a chance de brigar por vitórias nessa categoria. E
obviamente o seu desejo era completar a sua 20ª temporada de F-1, mas seria
novamente uma frustração disputar essa temporada com um carro sem chances de vitória.
(Pablo Melo e Leonardo Martins) Luciano Burti, qual sua opinião sobre o Felipe Nasr, que está hoje na
categoria GP2? Será que pode vir a se tornar futuro campeão Mundial?
LB:
Vejo com muito bons olhos o Felipe Nasr. Ele tem uma boa formação e já conta
com profissionais experientes cuidando de sua carreira. E o Brasil sempre teve
tradição de bons pilotos na F-1, então espero que ele, Razia, Foresti e outros
consigam alcançar seus objetivos. Mas para ele, que está estreando GP2, isso
ainda é assunto para daqui dois anos.
(Pablo Melo) O
Bruno Senna está no caminho ideal fechando com a Willians? Sobre o Nelsinho
Piquet, será que ele tem chance ainda de voltar a F1 depois do acontecido com a
Renault?
LB: A
Williams tem um carro bem superior ao de 2011, mas mesmo assim ainda é um
equipamento para brigar, em condições normais, apenas com as equipes médias.
Mas o Bruno é inteligente e já mostrou potencial. Sobre Nelsinho, ele mesmo já
escolheu outro caminho.
(Cleyton Santos)
Qual a sua opinião sobre: VICAR; Stock Car e CBA (Confederação Brasileira de
Automobilismo)?
LB: A
Vicar tem feito um bom trabalho na promoção da Stock Car e no ano passado nós
cobramos muito da participação da CBA em alguns detalhes, via Comissão de
Pilotos. As coisas começaram a melhorar, mas é preciso um esforço contínuo.
(Luca Gomes)
Burti, você competiu e viveu a atmosfera da F-1 com o Michael Schumacher. Na
sua avaliação, o Vettel pode chegar ao mesmo patamar do recordista de títulos
do esporte?
LB: A
maior parte dos recordes, o Schumacher quebrou na melhor fase da história da
Ferrari, entre 2000 e 2005. Então, independentemente do talento do piloto, o
mais importante para que alguém consiga atingir essas marcas é ter um carro
extremamente competitivo em mãos por muito tempo e isso não é fácil.
Atualmente, o carro da RBR é muito superior aos demais, mas uma hora a moleza
acaba. Então este é o desafio do Vettel.
(Matheus Rocha)
Das pistas que você correu tanto na F-1 quanto na Stock, qual a mais difícil de
cada categoria e por que?
LB: Na
Stock Car, dá para falar de Londrina, que é uma pista com características bem
distintas, é difícil equilibrar o carro para todos os trechos. Na Fórmula 1,
uma das mais técnicas é Spa-Francorchamps. É um circuito com muitas retas e,
portanto, os carros são ajustados com pouca asa. Isso dificulta a aderência em
curvas de alta velocidade. No final da curva você se sente em uma
montanha-russa, o carro parece que vai decolar. E tem a Eau Rouge. Na minha
opinião, nenhuma curva exige tanto do físico do piloto quanto essa.
(Vinicius Brino e Wilson Hebert) A ausência de um grande ídolo como Ayrton Senna tem feito com que o
interesse do brasileiro pelo automobilismo seja menor?
LB: A
presença de um grande ídolo sempre alavanca o esporte, como aconteceu com o
tênis, com a natação... Então com certeza ajuda. Mas o público da Fórmula 1 é
bastante fiel, é uma relação diferente dos outros esportes.
(Vinicius Brino) Felipe
Massa já foi de aspirante a ídolo a decepção. Até onde o brasileiro pode
chegar?
LB: Perguntam
se foi o acidente, mas acho que não. Quando ele voltou, a equipe não era mais
aquela com o (Kimi) Raikkonen, onde ele era o preferido. O Alonso acabou
conquistando o time e o Felipe não tinha mais o mesmo espaço. Aquele episódio
da Alemanha abalou muito a autoconfiança dele. Percebeu que as coisas não eram
como antes. Isso mexeu demais com o psicológico do Felipe. Em termos de
talento, ele ainda é o mesmo, apenas com a autoconfiança abalada. Acho que tudo
depende de como ele vai trabalhar isso daqui em diante.
(Daniel Junior) Se
é tão difícil acharmos um piloto à altura de Ayrton Senna (em carisma, talento,
ousadia, velocidade), estamos tão distantes de termos ao "menos" um
novo campeão mundial?
LB:
Depende fundamentalmente dos nomes que estão chegando e também do que será
feito pelas categorias de base do nosso automobilismo. Se nada for feito, se a
nossa base não ganhar força, com certeza ficará mais difícil revelar bons nomes
para a Fórmula 1.
(Lívio Galdeano)
Para atender o regulamento deste ano, várias equipes adotaram o degrau no bico.
Das grandes apenas a McLaren não optou pela novidade, você acha que a equipe
pode ter cometido um erro em não seguir a tendência?
LB:
Fica difícil avaliar pelos testes de pré-temporada, mas até agora a McLaren tem
aparecido entre as equipes mais confiantes e satisfeitas com os resultados,
mesmo sem adotar o novo bico. Não vejo nenhuma preocupação, não.
(Lívio Galdeano) No
período em que você foi piloto de testes da Ferrari, o que mais lhe chamou a
atenção do trabalho de Schumacher?
LB: O
grande ponto forte de Schumacher é o talento natural. Isso ficou evidente para
todos na F-1. Ele era imbatível nas curvas de alta velocidade, era o único
piloto que fazia certas curvas “cravado”, enquanto todos os outros tiravam o pé
do acelerador, andava no limite já nas primeiras voltas de um treino de
sexta-feira (mesmo com pista suja, em traçados desconhecidos de novos
autódromos etc.) e possuía um controle do carro de fazer inveja.
(Lívio Galdeano)
Quais os motivos que levaram você a não conseguir se manter na Fórmula 1?
LB:
Hoje, em retrospectiva, eu entraria na F-1 com mais maturidade, cheguei lá
muito ingênuo, muito bonzinho. Eu era muito despreparado até no lado pessoal
para lidar com a F-1. Não estou dizendo que para você lidar com a F-1 você
tenha que ser má pessoa, mas você precisa ser mais duro, ter mais maturidade,
ser mais forte, lidar com pressão e ter um certo egoísmo.
(Bruno Cassali)
Como foi a transição entre as pistas e a cabine?
LB: Comentar de certa forma é até mais difícil do que
pilotar. A primeira vez que andei de kart, fui bem. A primeira corrida que fiz
na Europa, ganhei. A primeira vez que andei de F-1, fui bem. Não estou falando
que eu sou Ayrton Senna, mas é uma coisa mais natural. A comunicação é uma
coisa muito mais difícil do que as pessoas imaginam, na televisão
principalmente. Por um tempo, acho que comentar foi mais difícil que pilotar.
"O grande ponto forte de Schumacher é o talento natural. Isso ficou evidente para todos na F-1. Ele era imbatível nas curvas de alta velocidade, era o único piloto que fazia certas curvas 'cravado'..."
(Bruno Cassali) Tu
tens algum receio de dividir a transmissão com o maior locutor esportivo que o
Brasil já teve?
LB:
Para mim, é uma honra, o Galvão narra, desde F-1, futebol, bolinha de gude...
Tudo o que ele vai narrar ele narra bem. Minha parte é a parte técnica, que eu
sempre falo, de dentro do carro. Nos damos bem por conta disso, um não
interfere na parte do outro. Acho até que para a própria Globo isso foi uma
referencia boa, uma vez que depois que eu entrei, o esporte olímpico sempre
tinha um ex-atleta nos comentários.
(Wilson Hebert) As
inúmeras mudanças de regras na Fórmula 1 com o objetivo de tornarem as corridas
mais parelhas são vistas por você como positivas ou negativas?
LB: Eu
vejo como positivas. As pessoas reclamavam que a Fórmula 1 não tinha mais
ultrapassagens e depois começaram a reclamar que havia ultrapassagens demais
com a nova asa, que ficou meio artificial. Eu acho que as mudanças são válidas,
sim, e acho que as corridas ficaram mais interessantes com as regras de pneus,
da asa, etc.
(Leandro Gomes) Como
foi trabalhar com as lendas do automobilismo Jackie Stewart e Alain Prost? Conseguiu
aprender muito com eles?
LB: Foram
duas experiências incríveis. São dois caras que sempre se envolveram muito como
chefes de equipe. O Jackie foi o chefe de equipe que me permitiu andar de
Fórmula 1 pela primeira vez e o Alain Prost foi quem me ofereceu a chance de
dar sequência à minha carreira na Fórmula 1 depois da saída da Jaguar.
(Leandro Gomes)
Você disputou a F3 Inglesa em 1999 tendo Jenson Button como um de seus
adversários, e inclusive terminou o campeonato na frente dele. Como foi correr
contra ele naquela época? Já era possível perceber que ele tinha potencial para
ser o grande piloto que é hoje?
LB: Sem
dúvida, ele sempre foi muito bom. Tenho uma boa relação com o Button até hoje
por causa da época de F-3 Inglesa. Disputamos muito, mas não houve problema,
nunca batemos. Foi uma relação competitiva, mas boa. Ele é um cara do bem,
torço por ele. Quando ele foi campeão da F-1, fiquei feliz, considero um amigo
até hoje.
(Leandro Gomes)
Você sentiu alguma diferença em sua pilotagem após o acidente na Bélgica em
2001?
LB:
Nenhuma. Fiquei cinco dias em coma e voltei a pilotar na Fórmula 1, com a
Ferrari, quatro meses depois da batida. Claro que ainda era cedo e eu precisei
de tempo para chegar ao nível que eu queria. Mas os médicos diziam que eu
jamais voltaria, então hoje para mim é uma alegria muito grande dizer que nada
mudou na minha pilotagem, que entro num carro e guio com a mesma alegria e a
mesma performance de antes do acidente.
Burti é piloto da Itaipava Racing na Stock Car. Fonte: assessoria/Burti |
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